A febre reumática é uma doença inflamatória de caráter autoimune que resulta como sequela de uma infeção pela bactéria estreptococo do grupo A e afeta sobretudo as crianças e os jovens entre os 5 e os 15 anos.
Tem maior predominância em países em vias de desenvolvimento, chegando a afetar 80% da população nestes países.
Surge frequentemente em ambientes de baixo nível socioeconómico, onde proliferam grandes aglomerações de pessoas e má nutrição associadas a um sistema de saúde pouco eficiente.
Em países desenvolvidos como Portugal, a incidência da doença é mais reduzida, afetando cerca de 2 por cada 100.000 crianças. Está fortemente relacionada com a pobreza e a má nutrição.
Neste artigo vamos explicar o que é a febre reumática, quais as causas, os sintomas e como pode ser tratada.
O que é febre reumática?
A febre reumática é uma doença autoimune com origem inflamatória que surge depois de uma infeção pela bactéria estreptococo quando esta ataca a garganta e não é tratada corretamente. Também designada por reumatismo infecioso, pode afetar várias áreas do organismo como a pele, articulações ou mesmo o coração e o cérebro.
Embora possa ocorrer em qualquer idade, é mais frequente entre os 5 e os 15 anos de idade, tendo uma taxa de recorrência de cerca de 50%.
Quais as causas da febre reumática?
A causa mais comum é a infeção provocada pela bactéria Streptococcus pyogenes, que ataca sobretudo a faringe e pode provocar escarlatina.
A febre reumática surge então como uma complicação destas doenças prévias. Com a febre, o sistema imunológico identifica células e tecidos normais no organismo como ameaça e ataca-os, devido a este processo a febre reumática é considerada uma doença autoimune.
As causas exatas da doença ainda não estão totalmente compreendidas, mas sabe-se que alguns fatores podem aumentar o risco de desenvolvimento da doença. Alguns desses fatores são:
- Hereditariedade: Algumas pessoas podem ter uma carga genética que as torna mais propensas a desenvolver a doença.
- Tipos de bactérias: Algumas bactérias da família do estreptococo são mais suscetíveis do que outras de causar febre reumática.
- Meio ambiente: a falta de saneamento básico e excesso populacional em determinados locais, parecem estar associados a surtos de febre reumática.
- Idade: a doença ocorre mais frequentemente em faixas etárias específicas, dos 5 aos 15 anos, o que sugere que o risco de contração da doença é maior nestas idades.
Qual o tratamento da febre reumática?
O principal objetivo do tratamento é eliminar a infeção e inflamação, aliviar os sintomas e evitar reincidências.
O tratamento habitual consiste na toma de medicamentos, como anti-inflamatórios e antibióticos, acompanhados ou não por repouso do doente, dependendo da gravidade da doença ou se a febre atinge o coração, o que neste caso pode implicar repouso absoluto.
O antibiótico geralmente prescrito é o Benzetacil que, dependendo da gravidade, pode ser aplicado em formato de injeções intramusculares, sobretudo se houver comprometimento do coração.
Os medicamentos atuam sobre as dores e inflamação nas articulações. O tratamento posterior a um episódio agudo da doença que não tenha sido devidamente cuidado, é mais paliativo do que curativo e pode já não impedir o desenvolvimento de complicações, sobretudo a nível cardíaco. Por este motivo, é aconselhável que o tratamento não ultrapasse os 7 dias depois do aparecimento dos sintomas.
Quais os sintomas da febre reumática?
Os sintomas da febre reumática são muito variados e têm também uma variação individual, ou seja, algumas pessoas podem apresentar muitos sintomas e outras menos.
Os sintomas também podem variar ao longo do decurso da doença e afetar diferentes órgãos, sendo que a febre propriamente dita surge normalmente, entre 2 a 4 semanas após a infeção pela bactéria.
Os sintomas gerais da febre reumática costumam aparecer entre 2 semanas até 6 meses após a infeção pela bactéria, podendo durar vários meses e estando dependente do tratamento adequado e da imunidade dos doentes.
Além da febre que pode atingir os 39 graus centígrados, os principais sintomas são:
- Dor ou sensibilidade nas articulações: que pode atingir os tornozelos, joelhos, cotovelos e pulsos, com um processo migratório, ou seja, vai alternando entre as diferentes articulações e pode durar até 3 meses. Inchaço, calor e vermelhidão nas articulações também podem aparecer.
- Pequenos nódulos indolores sob a pele ou manchas avermelhadas. Os nódulos são geralmente indolores, endurecidos, sem apresentar inflamação. Podem medir entre 0,5 e 2 cm, aparecendo em média entre 3 e 4 nódulos distribuídos pelo cotovelo, punhos e joelhos, que desaparecem após 1 mês. Ocorrem em 10% dos casos e apenas nos pacientes que também apresentam problemas cardíacos. Estes nódulos são idênticos aos da artrite reumatoide.
- As manchas vermelhas surgem sobretudo no tronco e membros. Ficam mais evidentes em temperaturas quentes e podem durar anos, aparecendo e desaparecendo ao longo do tempo. Ocorre em 5% dos casos.
- Coração: dor no peito, falta de ar, fadiga, sopro cardíaco, inchaço nas pernas, inflamação do músculo cardíaco, prostração. As lesões nas válvulas do coração podem causar insuficiência cardíaca. A cardite é uma das consequências mais graves da febre reumática e ocorre em cerca de 40 a 50% dos casos.
- Corpo: instabilidade emocional, fraqueza muscular e movimentos rápidos, descoordenados e espasmódicos que afetam principalmente o rosto, os pés e as mãos. Este conjunto de sintomas é designado por Coreia de Sydenham.
Como é feito o diagnóstico?
Como os sintomas da febre reumática são muito variados, podem por vezes ser confundidos com outras doenças, é imprescindível por isso que o diagnóstico seja feito por um médico especialista que poderá ser um pediatra, reumatologista ou um especialista de medicina geral e familiar.
Um diagnóstico adequado é extremamente importante, já que se uma infeção causada pela bactéria estreptococo não for tratada corretamente, além de dar origem à febre reumática, pode originar complicações para outros órgãos como o coração, por exemplo.
O médico irá fazer um exame físico para verificar a existência de sintomas, como inflamação nas articulações, existência de febre ou nódulos na pele.
Outros exames poderão ser necessários para determinar o diagnóstico:
- Análises ao sangue: para verificar a existência de infeção.
- Eletrocardiograma ou ecocardiografia: para verificar o coração e se há alguma estrutura alterada neste órgão.
- Exame às secreções da garganta: através do exame ASLO, para identificar a presença da bactéria, ou a presença de anticorpos contra a bactéria.
Quais as complicações da febre reumática?
Como a febre reumática pode ter uma duração mais prolongada, chegando a decorrer por vários meses, a probabilidade de ocorrerem complicações é elevada.
Uma das complicações mais comum é a cardiopatia reumática, que implica danos permanentes no coração, o que por sua vez se traduzem em:
- Danos no músculo cardíaco
- Danos nas válvulas e tecidos cardíacos
- Estenose da válvula cardíaca
- Pericardite
- Fibrilação atrial
- Endocardite
- Arritmias
- Insuficiência cardíaca
As reincidências ou surtos da febre reumática vão piorar o estado do coração de cada vez que acontecem, em casos extremos poderá ser necessário realizar uma cirurgia para substituir a válvula cardíaca.
Febre reumática tem cura?
A febre reumática tem cura e o tratamento deve ser aplicado o mais precocemente possível para evitar complicações em órgãos essenciais como o coração.
A recuperação é feita normalmente com uma combinação entre repouso e medicamentos, como antibióticos e anti-inflamatórios. No entanto, a doença pode reaparecer em doentes que não seguiram o tratamento adequadamente ou pararam o tratamento antes do tempo indicado pelo médico.
Como podemos prevenir a febre reumática?
A melhor forma de prevenir a doença é fazer um tratamento adequado às infeções da garganta pela bactéria estreptococo, que deve ser feito de acordo com as recomendações do médico e de forma completa, ou seja, até ao fim mesmo que não haja sintomas.
Neste sentido, a prevenção é extremamente importante para evitar não só o aparecimento da doença, mas também as suas potenciais complicações, que podem afetar drasticamente a qualidade de vida dos doentes.
No caso dos doentes que já tiveram uma ocorrência de febre reumática, a prevenção deve ser focada em evitar uma reincidência ou complicações mais graves.
Como o risco de novos episódios é muito elevado, o uso prolongado de antibióticos como meio de prevenção, é muitas vezes aconselhado, podendo este tratamento chegar aos 21 anos de idade dos pacientes ou até 5 a 10 anos depois do último surto. Para os doentes que ficaram com sequelas cardíacas a profilaxia medicamentosa pode ir até aos 40 anos de idade.
Conclusão
A febre reumática continua a ser hoje em dia uma das maiores causadoras de doenças cardiovasculares, apesar da diminuição considerável de casos nos países desenvolvidos.
A prevenção da doença assume assim um papel preponderante para evitar o seu surgimento e consequentes sequelas na saúde de crianças e jovens ao longo das suas vidas.
Uma das medidas mais importantes é iniciar o tratamento logo nos dias a seguir ao surgimento dos primeiros sintomas, mas como a doença tem sintomas muito variados e que podem ser confundidos com outras doenças, torna-se essencial fazer uma vigilância consistente da saúde infantil.
É uma doença que se cura facilmente com medicamentos quando se manifesta por um episódio agudo mas, lesões cardíacas são as sequelas mais graves da doença e podem ser evitadas se o tratamento for seguido até ao fim e de acordo com as indicações médicas.
Referências:
- Sociedade Portuguesa de Reumatologia
- Sociedade Portuguesa de Pediatria
- Associação de saúde Infantil de Coimbra
- Organização Mundial de Saúde
*Atenção: O Blog Mais que Cuidar é um espaço informativo, de divulgação e educação sobre temas relacionados com saúde e bem-estar, não devendo ser utilizado como substituto ao diagnóstico médico ou tratamento sem antes consultar um profissional de saúde.