À medida que as pessoas envelhecem começam a surgir algumas situações que se tornam mais frequentes como algum descuido na higiene pessoal, faltas a consultas médicas ou esquecimentos mais constantes relacionados com atividades diárias.
Nestas circunstâncias, muitos familiares consideram a hipótese de procurar um prestador de cuidados para ajudar em casa, mas os idosos recusam imediatamente e, por vezes, esta sugestão é até recebida com raiva e ressentimento, com os idosos a insistirem que são suficientemente saudáveis e que podem tomar conta de si próprios.
Independentemente da situação, do estado da casa ou da condição física do idoso, não se pode forçar a ajuda aos idosos quando eles são competentes e capazes de tomar decisões por si próprios.
Os idosos têm o direito de recusar ajuda, mas nos casos em que é bastante evidente que o idoso precisa de ajuda, é aconselhável encarar a situação e tomar medidas adequadas, em vez de esperar até que ocorra uma crise de saúde grave.
A recusa de ajuda é uma ocorrência muito comum entre os idosos e é importante saber como acalmar os receios naturais.
As razões porque os idosos oferecem resistência são pessoais e possivelmente complexas, mas podem incluir, por exemplo o facto de acharem que não precisam de ajuda ou de não quererem estranhos em casa. Por todos estes motivos é importante perceber as razões que estão por trás deste comportamento.
Quer seja porque a pessoa começa a ter dificuldades nas tarefas diárias, como cozinhar ou lavar o cabelo, quer tenha estado no hospital e precise de apoio antes de poder regressar a casa, perceber qual o melhor caminho a seguir pode exigir muito esforço e compreensão.
Neste artigo explicamos algumas situações comuns que explicam por que razão um idoso pode estar relutante em aceitar cuidados e como se podem encontrar soluções que ajudam ao bem-estar de todos.
Porque é que uma pessoa idosa recusa cuidados?
As razões porque os idosos recusam os cuidados podem ser muito variadas e depender de fatores pessoais e específicos a cada situação.
Estes são alguns exemplos de razões que podem dar origem a este comportamento:
Perda de independência
A maioria das pessoas idosas viveu de forma independente durante décadas. Por conseguinte, pode ser difícil aceitar ajuda para as tarefas quotidianas que antes eram fáceis, especialmente no que se refere a cuidados pessoais.
Pedir a outros pessoas ou familiares que ajudem nestas tarefas pode ser, por si só, estranho. No entanto, para muitas pessoas idosas, aceitar o apoio de um prestador de cuidados profissional ou utilizar dispositivos como barras de apoio ou proteção ou andarilhos pode parecer intrusivo e talvez até um pouco humilhante.
Pode até parecer o início de um lento declínio das suas liberdades, ou que vão ser forçados a uma solução que não querem.
Negar que existe um problema
Uma pessoa idosa pode ser demasiado orgulhosa para pedir ajuda quando precisa dela. Por outro lado, também pode não reconhecer que precisa de ajuda ou considerar as suas dificuldades como uma parte natural do envelhecimento, mesmo que seja óbvio para os outros que precisa de apoio adicional.
As pessoas que vivem com doenças como a doença de Alzheimer ou outras formas de demência podem não ter consciência das dificuldades que enfrentam.
Sensação de serem um fardo
Muitas vezes, uma pessoa idosa pode sentir que o facto de não poder continuar a fazer todas as coisas que fez ao longo da sua vida pode causar problemas aos outros.
Mesmo que apenas necessite de assistência em tarefas como as compras, o trabalho doméstico ou a jardinagem, pode sentir que pedir ajuda pode colocar a responsabilidade nos seus familiares.
A prestação de cuidados pode naturalmente alterar a relação entre a pessoa que necessita de cuidados e a pessoa que os presta. Se uma pessoa idosa estiver a ser cuidada por um familiar, a aceitação da inversão de papéis pode parecer pouco natural ou estranha no início.
Se estiver a ser cuidada por um parceiro ou cônjuge, a pessoa idosa pode preocupar-se com o facto de a relação se tornar unilateral ou uma obrigação, em vez de um compromisso emocional.
Medo do desconhecido
O facto de não ter a certeza do que o futuro lhe reserva pode impedir uma pessoa idosa de falar.
Por exemplo, o idoso pode recear que o facto de admitir os seus problemas signifique que terá de ir para um lar de idosos, pelo que lutará o mais possível para o evitar.
Mesmo que uma pessoa idosa só precise de um pouco de ajuda numa determinada altura, pode recear que, se o nível de cuidados de que necessita aumentar, tenha de abandonar a casa de que tanto gosta, deixar de conduzir e, essencialmente, perder uma grande parte de quem é.
O que fazer se um idoso recusar ajuda?
Apesar de existirem várias coisas que se podem fazer e conversar, é importante ter sempre em mente o respeito pela autodeterminação da pessoa idosa e ter em conta as suas circunstâncias de saúde e de vida.
Avaliar a situação primeiro
Antes de mais, é importante analisar as condições de vida, as atividades e a saúde mental dos idosos.
O que é que são capazes de fazer ainda e onde é que a ajuda é absolutamente necessária. Por outro lado, perceber também até que ponto é que valorizam a autossuficiência e os seus próprios objetivos.
Fazer esta avaliação é benéfico, pois permite ser direto e dar prioridade às preocupações quando for necessário conversar sobre a necessidade de ajuda. Permite também alinhar a intenção com o que valorizam e o que motiva o comportamento.
Idealmente, a conversa sobre as possíveis necessidades futuras de cuidados deve ser feita muito antes da necessidade efetiva de cuidados, para que todos estejam em sintonia e saibam o que cada um sente em relação à situação.
Deixar o processo decorrer devagar
Procurar momentos em que o idoso está mais bem disposto para abordar o assunto, mas não esperar fazer progressos após uma ou duas conversas.
Pode ser útil fazer perguntas abertas e deixar que a pessoa idosa leve o seu tempo a responder. Se precisar de refletir cuidadosamente sobre o assunto, garantir que não há problema em fazê-lo.
As conversas podem tornar-se repetitivas ou seguir direções inesperadas, mas manter o empenho e prosseguir ao ritmo natural.
É importante também ter preparação para que alguns aspetos dos cuidados sejam mais difíceis de falar do que outros. Algumas pessoas idosas que não querem discutir a questão dos cuidados com a família podem ter especial dificuldade em falar sobre a sua situação financeira, por exemplo.
Discutir as opções de cuidados numa fase inicial
Idealmente seria desejável chamar a atenção para a necessidade de cuidados antes de o idoso passar por uma emergência de saúde ou outra crise.
Falar com o idoso sobre os cuidados e sobre a possibilidade de beneficiar de assistência nas tarefas domésticas pode chamar a atenção para as suas necessidades numa fase inicial.
O idoso pode não estar ciente das opções de cuidados em casa, por isso, explicar essas opções pode tranquilizar e dar confiança para falar sobre as suas necessidades e discutir as suas preocupações quanto a aceitar ajuda.
Fazer uma avaliação racional da situação
Os idosos têm o direito de decidir que tipo de apoio querem aceitar e podem sentir que estão a ser forçados a aceitar uma situação que não lhes agrada.
Se o idoso precisar de cuidados rapidamente, o stress e a frustração poderão influenciar o estado de espírito de todos, e é por isso que falar sobre as preocupações e inquietações acerca dos cuidados será útil para todos.
Falar de forma objetiva e racional e perceber quais são as suas preocupações, é o melhor caminho.
Tentar compreender os receios do idoso
À medida que envelhecem, é natural que, embora as pessoas se sintam fisicamente mais velhos, emocionalmente continuam a sentirem-se jovens e capazes.
Se a pessoa idosa sempre viveu de forma independente, pode sentir-se ofendida por lhe sugerirem que já não consegue viver da mesma forma, o que pode gerar tensão e frustração em ambas as partes.
Ter em conta o estigma em torno dos cuidados a idosos
Embora possa parecer que comprar um dispositivo de assistência à mobilidade ou inscrever o idoso num serviço de assistência está a ser útil, para os idosos pode parecer que estão a perder a independência, e o sentimento que isso pode incutir em alguém nunca deve ser subestimado.
Ser considerado idoso e incapaz de lidar com as coisas pode ser a única coisa que o idoso sempre receou que acontecesse na sua vida, e agora vê os seus maiores receios tornarem-se numa realidade.
Ser realista
Embora seja importante preservar e manter a segurança do idoso, também é importante não sufocar e proteger excessivamente o idoso, tornando a sua vida infeliz.
É importante não idealizar demais o que se pode fazer nos cuidados aos idosos, nem descurar os cuidados necessários. Uma atitude mais equilibrada e realista é a melhor estratégia para encontrar a melhor forma para proporcionar os cuidados que o idoso necessita.
Aceitar que alguns prestadores de cuidados podem não ser adequados
Talvez o idoso possa ficar ansioso com o tipo de pessoa que irá receber em casa, pensando que será alguém com quem não tem nada em comum. Para algumas pessoas, é difícil imaginar um estranho a entrar em casa, especialmente se for para realizar tarefas pessoais.
O ideal é conversar com o prestador de cuidados também para tentar perceber se há alguma afinidade entre ele e o idoso.
Explorar opções alternativas
Algumas pessoas idosas podem chegar à conclusão de que serão obrigadas a abandonar as suas casas se já não conseguirem viver de forma independente. Dedicar algum tempo a explorar diferentes tipos de cuidados pode ajudá-las a sentirem-se mais positivas em relação a aceitar apoio.
Por exemplo, se a casa já não se adequa às necessidades, o apoio domiciliário pode ajudar a manter a casa própria enquanto é dada ajuda adicional 24 horas por dia para fazer compras, lavar roupa e cozinhar.
Se o idoso estiver inseguro quanto a ter um cuidador em casa, um curto período de cuidados temporários no domicílio, pode dar a oportunidade de experimentar conviver com um prestador de cuidados durante algum tempo.
Ouvir atentamente e aceitar os sentimentos do idoso pode ajudar a decidir qual o apoio que é mais adequado. Um amigo ou um vizinho que possa acompanhar o idoso, pode ser outra solução alternativa.
Dar a possibilidade ao idoso de controlar a sua vida
Preservar a independência de uma pessoa é muito importante quando se está a prestar cuidados ao domicílio, encorajar o idoso a continuar a realizar a sua rotina diária, se assim o desejar, é uma parte importante dos cuidados centrados na pessoa.
O facto de alguém apoiar em certos aspetos da vida não significa que os idosos tenham de se tornar passivos nos seus cuidados. Por exemplo, podem preparar a comida em conjunto ou garantir que podem continuar a assumir aspetos dos seus cuidados pessoais.
Começar devagar é sempre a melhor opção, talvez instalando um dispositivo em casa que possa alertar alguém, por exemplo, pode garantir a segurança enquanto o idoso sente que a sua casa continua a ser sua.
Envolver o idoso em todas as conversas sobre cuidados e colocar os seus desejos em primeiro lugar pode fazer uma enorme diferença na forma como se sentem em relação à perspetiva dos cuidados.
Se a pessoa idosa estiver disposta a receber cuidados profissionais, o seu controlo não deve parar depois de ter decidido uma opção e de ter começado a organizar os cuidados.
Também é importante permitir que o idoso encontre um prestador de cuidados com quem se sinta confortável e com quem se dê bem.
Como abordar a questão com os restantes membros da família
Se houver vários familiares envolvidos na decisão sobre os cuidados a prestar, pode gerar uma situação difícil e não se conseguir chegar a acordo sobre a melhor forma de atuar. Os familiares podem não ter consciência de todo o esforço e trabalho que é necessário fazer.
Se um familiar vive longe, pode não se aperceber de como é o dia a dia do idoso ou não estar preparado para aceitar que as suas necessidades estão a mudar, especialmente se ainda era bastante independente da última vez que o viu.
As famílias são complexas e é normal sentir emoções fortes quando se fala de cuidados. Para que se possam ter conversas saudáveis sobre o assunto, escolher um ambiente que seja calmo e seguro para todas as partes.
Manter a mente clara e equilibrada, evitando o stress. abordando todos os envolvidos com empatia, tentando compreender o ponto de vista do outro, congruência, sendo genuíno e autêntico com a outra pessoa, e consideração positiva incondicional, ou seja,respeito e sem julgamento.
Pedir ajuda a um profissional de saúde
Se o idoso precisa de ajuda com os seus cuidados, mas recusa-se a falar sobre isso, tentar pedir a um médico ou enfermeiro que fale sobre o assunto com o idoso.
Muitas vezes, as pessoas estão mais dispostas a ouvir um profissional de saúde do que os seus familiares, e se um médico de clínica geral ou um enfermeiro abordar o assunto ou sugerir que o idoso pode beneficiar de cuidados, pode ser mais fácil falar sobre as suas necessidades.
Uma pessoa idosa pode ser forçada a ir para um lar?
Em Portugal, uma pessoa não pode ser forçada a mudar-se para um lar de idosos se tiver capacidade mental para recusar e expressar os seus desejos por uma solução alternativa.
Se as necessidades de cuidados de uma pessoa idosa puderem ser satisfeitas em segurança na sua própria casa, ela tem todo o direito de aceder a cuidados domiciliários se o entender.
A decisão de um assistente social deve ser tomada no melhor interesse da segurança e da qualidade de vida do indivíduo, e deve considerar todas as opções de cuidados potenciais.
Algumas medidas simples podem também proporcionar ao idoso mais segurança para ficar em sua casa ou antes de ir para um lar:
Estabelecer uma procuração de saúde e bem-estar e uma procuração financeira a uma pessoa de confiança
Efetuar algumas adaptações em casa para a tornar mais adequada às novas necessidades de cuidados ou aos sintomas progressivos de demência
Indicar a um advogado ou terceiros as diretrizes explícitas sobre a forma como o idoso pretende que lhe sejam prestados cuidados no futuro
Quando o idoso continua a recusar
Se foram utilizadas várias estratégias e o idoso está decidido a recusar o apoio domiciliário ou os serviços de cuidados ao domicílio, é necessário aceitar a sua escolha.
Por muito frustrante que seja, o idoso é um adulto e precisa de tomar a decisão por si próprio, mesmo que seja uma má escolha.
Quando esta situação surge, não rejeitar nem contestar a opinião do idoso. Em vez disso, continuar a oferecer ajuda, amor e apoio ao idoso. No seu próprio tempo e nos seus próprios termos, poderá perceber que a ajuda seria benéfica para a sua vida.
Entretanto, o melhor que se pode fazer é aceitar a situação, desfrutar do tempo que se passa com o idoso e comunicar-lhe claramente que terá a família sempre ao seu lado, quer ele mude de ideias ou não.
Conclusão
Poder ser um choque quando os familiares se apercebem que os idosos não estão a conseguir lidar bem com a situação em casa. Talvez a casa e o jardim estejam com um aspeto mais caótico e o idoso esteja a depender mais de refeições ligeiras do que de refeições nutritivas.
Talvez o seu asseio ou higiene tenham diminuído acentuadamente, esteja socialmente isolado ou não faça as coisas de que costumava gostar. Pode estar a perder peso, ter sofrido uma queda, não estar a tomar os medicamentos corretamente e a correr o risco de ser enganado por pessoas mal intecionadas.
Os familiares preocupam-se e querem que o idoso esteja seguro e saudável. Surge a necessidade de falar sobre cuidados a idosos, mas deparam-se com uma recusa rápida e uma declaração indignada de que não precisam de ajuda.
Esta é uma situação muito comum e é necessário adotar algumas medidas para fazer a transição para os cuidados mais suavemente.
Envelhecer traz mudanças drásticas nos hábitos e fatores do estilo de vida, muitos dos quais estão enraizados desde a juventude. Compreender as razões pelas quais os idosos recusam ajuda é importante para abordar a conversa com empatia e respeito.
Os idosos estão numa fase da vida diferente dos familiares mais jovens e têm os seus próprios pensamentos, emoções, motivos e medos.
Em suma, o envelhecimento pode ser assustador. A sensação de independência e controlo da própria vida é ameaçada por declínio cognitivo, deficiência física, e pela eventual necessidade de cuidadosos, os idosos podem sentir uma série de emoções como, medo, frustração, impotência ou incompreensão.
Acima de tudo, o sentimento de uma grande perda de identidade e de valor é comum à medida que as pessoas envelhecem. A sociedade tende a encarar o envelhecimento como algo negativo e indesejável.
Por todos estes motivos, é fundamental que os familiares abordem os idosos com validação, cuidado e segurança.
É importante que numa fase de necessidade de apoio com cuidados, os idosos saibam que, apesar de poderem estar a sofrer de incapacidades ou mudanças imprevisíveis, são sempre importantes e têm sempre importância para os seus familiares.
Apesar de aceitar ajuda poder ser um processo difícil para os idosos, importa não esquecer que são seres autónomos e merecem respeito. Ajudar a que entendam que os cuidados lhes podem trazer muitos benefícios é a melhor forma de os ajudar a aceitar a situação.
Juntos Cuidamos Melhor!
Referências:
- Associação Portuguesa de Psicogerontologia
- Elder.org
*Atenção: O Blog Mais que Cuidar é um espaço informativo, de divulgação e educação sobre temas relacionados com saúde e bem-estar, não devendo ser utilizado como substituto ao diagnóstico médico ou tratamento sem antes consultar um profissional de saúde.